quarta-feira, 31 de março de 2010

Um crime, um julgamento, Isabela morta




Não sou fã de TV, mas adoro assistir filmes investigativos, que trazem crimes insolúveis e sua trama envolvente. E como briguei com a TV faz um bom tempo pela sua péssima qualidade de conteúdo, esta semana fiquei feliz por ver as pessoas comentarem algo diferente do capitulo da novela ou da ultima pegada no Big Brother e de uma Fazenda que tem não sei em que canal.
E assim o Brasil finalmente parou para assistir a uma coisa útil: o Julgamento dos Nardoni.
Depois de tanto final de novela e de Big Brother, brasileiros e brasileiras se prontificaram por horas e horas a assistir um verdadeiro espetáculo de inteligência da pericia deste país tão desacreditado, desta lei tão direcionada aos desfavorecidos socialmente, deste código penal tão injusto com quem é vítima de um crime.
Comentários ouvi e li aos montes, inclusive por quem é da área jurídica e muito me surpreendeu constatar que existem advogados revoltados contra o resultado, revoltados contra provas técnicas vindas da habilidade de quem não precisa de palavras para dizer o que aconteceu, a arte de saber contar a história sem estar presente.
E nesta linha de pensamento nós brasileiros expectadores de tanta coisa bárbara nesta nação ficamos surpresos, maravilhados e boquiabertos por um trabalho que parecia filme de Hollywood, afinal, nos acostumamos a ver tudo acabar em pizza, a ver bandido ganhar status de estrela.Vivemos enfim numa inversão de valores que até virou simbolismo.Neste país tudo é posto em cheque, o que é para ser regra torna-se exceção e a exceção de tanto ser concedida a ela um lugarzinho, uma cota ou algo parecido acaba por tornar-se regra também. E aí você vê o assassino ter alguém que o defenda ou pelo menos tente minimizar a desgraça que ele fez com o seu semelhante.
Os Nardoni, em especial o pai que era advogado, esqueceu no seu momento de ira contra a criança que o corpo fala, as pistas mostram o caminho e alguém muito capacitado junta as peças do quebra-cabeça e chega em alguém.
É óbvio que Isabela era agredida bem antes disso. A violência doméstica contra a criança e contra a mulher começa pequeno. Um empurrão, um tapa, um murro, uma surra de cinturão, uma esganadura e por fim a morte. Violência que se alterna com momentos de carinho e atenção, se uma mulher vitima de violência não consegue se livrar da situação imagine uma criança que nesta idade não tem nem formação de juízo.
Por outro lado a criação dada pelos pais de Alexandre Nardoni provou que a forma como você cria seus filhos diz muito do que você é. Filho de classe média alta, advogado que não exercia a função, casado com uma pessoa desequilibrada e pai de mais dois filhos, Alexandre não tinha o discernimento de se impor e não aceitar as agressões da esposa, não aprendeu a ter amor e respeito pelo seu laço de sangue, não aprendeu a amar seu semelhante, ou melhor, seu descendente, vivia numa relação destrutiva e destruiu várias vidas.
Pior do que um crime contra Isabela, Nardoni atentou contra a sociedade, contra toda uma constituição que diz não podermos ser vitima de abusos, torturas, agressões, que temos o direito de livre defesa, atentou contra a vida de um inocente sem chance de defesa, seu sangue, menor de 14 anos e sua filha. Faltastes esta aula Nardoni?
Não aprendeu a ser gente, ser pai, ser cidadão, ser chefe de família. No momento que chegou próximo ao corpo da filha, ligou para o pai ao invés de ligar para o resgate, lembrou que o pai resolvia todos os seus problemas desde que era criança, como se o acontecido fosse uma briguinha na escola a que ele recorria ao papai e este ia resolver coisas que crianças resolvem entre si para quando crescerem aprenderem a ter autonomia. Quando você diz “Meu filho você errou, assuma seu erro e não faça mais” você não está deixando de apoiá-lo, mas sim educando-o e provando que na vida a gente erra, mas se redimir e tentar consertar o erro é muito mais importante do que tentar encobrir.
As palavras são meros instrumentos muita das vezes desnecessários, os olhos falam, as expressões corporais entregam o seu sentimento, na primeira entrevista logo após a morte da criança, ficou bem claro para mim que trabalho vendo a emoção da perda todos os dias que eles eram culpados. Em momento algum houve revolta por quem cometeu o crime, o choro forçado, com lágrimas arrancadas mostraram toda a frieza que estas duas criaturas possuíam ali na frente de uma câmera para milhões de pessoas assistirem uma tentativa desesperadora de se dizer inocente, de dizer a toda uma nação que não eram monstros, poxa Nardoni, na sua disciplina de Psicologia você não aprendeu que os olhos desmentem as palavras?
A perícia, deu seu show a parte e veja que interessante, todos os profissionais envolvidos desde a delegacia que iniciou o processo eram unânimes em mostrar que eles eram culpados, a perita foi enfática e firme diante das provas e do que conseguiu montar, uma mulher admirável que está completando 30 anos de carreira e que se empenhou passo a passo, por que com certeza como toda boa brasileira não admite este tipo de crime, crime contra a infância, contra estes serezinhos que possuem um Estatuto e são protegidos por nós adultos e seus genitores. Conheces Nardoni o Estatuto da criança? Você achava que nossa perícia ainda era do terceiro mundo? Será que todo estes profissionais acostumados a trabalhar com crimes se enganaram?
Lamentavelmente seus filhos que ficaram quase órfãos também estão sofrendo por toda esse bombardeio, serão discriminados em todos os lugares, terão a ausência dos pais, porém, não perderão muita coisa em não ter a educação dada por eles apesar de que não escaparão de serem criados por quem os criou, seus avós. Imagina Nardoni no dia que seus filhos perguntarem
“Papai, é verdade que você jogou minha irmãzinha pela janela por que a mamãe se aborreceu com ela?”
ou se um deles lembrar do que aconteceu lá dentro daquele apartamento?
Nesta hora estará na mente da criança a sua imagem sendo jogada pela janela após uma traquinagem.
Jatobá representou milhares de mulheres que encontram um companheiro que já é pai e passa a disputar seu “homem” com a criança. Disputa de atenção, ciúmes da ex, vivem numa loucura interna de concorrer com uma criança que nem percebem o quanto isso é doentio e sem fundamentos, e seus companheiros não percebem que o amor pelo filho está sendo negligenciado e entram nesta barca furada de viver com uma pessoa insana, colocando seu filho, seu sangue em segundo lugar, mesmo por que normalmente possuem o mesmo perfil psicológico.
Revoltante é pouco, a pena é pouca, a tristeza é muita diante tanta barbárie, mas estarrecedor mesmo é vê-los sem confessar, essa é a prova de que são pessoas perigosas, medíocres, imaturas que num impasse apelam para a violência, precisam sim, ficar longe da sociedade e para quem defender dizendo que eles têm filhos para cuidar fica a resposta de que as crianças fazem parte da sociedade também e que estas precisam mais do que nunca ficar longe deles, afinal podem ser jogadas pela janela a qualquer momento.
Uma luzinha no fim do túnel se acendeu, mesmo que daqui a dez anos estejam nas ruas soltos e com a ficha limpa assim como aconteceu com os assassinos de Daniela Perez, uma coisa mudou desta vez, o povo se revoltou, mostrou que não aceita, que tem voz ativa, que este povo é o que trabalha, que batalha para criar seus filhos, que sofre a discriminação de ser pobre mas que dá lições de honestidade e de amor para os que coloca no mundo. Desta vez mesmo sem testemunhas o bom senso, a lógica prevaleceu, coisas de primeiro mundo, existem seres pensantes neste país viu Nardoni?
Se todos denunciassem quando descobrissem uma violência infantil, as coisas mudariam mais rápido. Existe um Estatuto, existe Conselho Tutelar, existe Juizado de Menores, para proteger nossas crianças. Somos seres racionais, não aprendemos por instintos, violência não ensina, deseduca. Amor, carinho, compreensão, educação são os verdadeiros ingredientes para se criar um cidadão de bem, humano, honesto, íntegro e correto.
Você terá 10 anos ou menos Nardoni para refletir e refazer sua faculdade, você não fracassou só como pai e cidadão, fracassou como profissional, envergonhou sua classe, alguns te defendem mas sabem no fundo a verdade, ela está aí para quem quiser ver com olhos atentos e lógicos.
Quando a criança é concebida com amor, quando o papel de pai e de mãe é feito na integra, como dever ser, Izabela nenhuma é jogada pela janela ou agredida pela madrasta.

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