sábado, 23 de janeiro de 2010
Zilda Arns - Isto sim, é Saúde Pública
Depois do fatidico acontecido com nossa médica brasileira Zilda Arns, resolvi escrever depois de vários dias passados o que esta cidadã representou no cenário Saúde Pública.
Começo reafirmando como sempre que fazer Saúde Pública não é tarefa fácil. Entrar no cotidiano das pessoas com seus costumes e tradições e tentar mudá-los leva tempo e paciência, mesmo por que existem certas coisas que não mudam, mas que podemos adequá-las a uma visão mais moderna.
Andar no sol e na chuva, bater de porta em porta, se encaixar na comunidade, aprender seu dialeto e costumes da região, perceber onde interceptar, ter sensibilidade para ouvir mais do que falar, isso tudo são atribuições de quem faz Saúde Pública.
O que Zilda representou com certeza muitos programas não o conseguiram, tendo todos os recursos disponíveis. Ela foi sábia, começou pela igreja por sugestão do então Dom Paulo. A igreja, local de reunião da maioria das pessoas e detentora de enorme influência sobre a população de todas as classes, foi o local escolhido para diminuir a mortalidade infantil, assim nasceu a Pastoral da criança em 1983 no Paraná.
Feito no mesmo estilo dos programas de saúde pública, que leva a informação pessoa a pessoa através de multiplicadores encontrados na comunidade, o soro caseiro foi difundido nas famílias para as mães e que estas pudessem salvar seus filhos de uma desidratação causada por diarréia.
Pessoalmente digo que é um trabalho guerreiro, mais difícil do que entrar em um carro capotado para imobilizar um paciente.
Ensinar a mãe a cuidar de seu filho e fazê-la entender a importância disso, minimizar as crendices que causam prejuízos e diminuir números de mortalidade é uma obra edificante, mas que requer todo o empenho de uma equipe. E Zilma conseguiu em sua primeira empreitada na pequena Florestópolis, Paraná baixar a taxa de 127 óbitos em cada 1000 crianças nascidas vivas para 28. Um número que enche de orgulho qualquer profissional de saúde. Hoje o programa é nacional e reconhecido em vinte países da América Latina, África e Ásia.Ela própria visitou cada canto deste país de avião, de barco e de ônibus para levar a informação a população,enfrentando todas as dificuldades que nós do Pré-hospitalar somos acostumados a ver todos os dias quando entramos na casa de alguém.
O soro caseiro nesta época difundido entre as comunidades e hoje mundialmente conhecido é uma medida barata, fácil de fazer e que restabelece a criança até um socorro mais adequado num hospital. Coisas que pensamos ser tão fáceis e úteis mas que passam despercebidas por milhares de pessoas. Assim como o tratamento da água, a importância da vacinação e medidas básicas de higiene.
Desidratação pode matar em pouco tempo(24 h). Dois, três episódios de vômito são suficientes para instalar o quadro. A perda de liquido na criança é sintoma importante, elas possuem 25% a mais de volume sanguíneo e quando se fala que uma criança está chocada (perda de volume) ela já está chocada há muito tempo, quadro difícil de reverter, porém fácil de evitar quando se toma medidas rápidas como o soro caseiro.
Outro foco da Médica pediatra e sanitarista Zilda Arns foi a nutrição também. Afinal nutrição e hidratação são os pilares da vida. A multimistura então desenvolvida por folhas e grãos complementa a alimentação de quem tem poucos recursos e não consegue comprar todos os alimentos que fazem parte da pirâmide alimentar. Mesmo sem precisar introduzi a multimistura na alimentação de meu filho, por que eu confio no trabalho deles.
Aqui em minha cidade, a Pastoral desenvolve um trabalho lindo. Além da multimistura e do soro caseiro temos a farmácia natural. Medicamentos feitos a partir de ervas de eficiência comprovada que ajudam a cura de doenças simples, sem desmerecer a indústria farmacêutica.
Medidas simples, baratas e que salvam vidas. Aliadas as medidas profiláticas como tratamento da água para combater verminoses, tratamento do esgoto, meio ambiente, destino do lixo, objetivos principais da Saúde Pública, bom e barato, fácil e acessível, porém de pouco valor para o sistema que insiste em investir no curativismo, na reabilitação.
Trabalhos como o da Zilda, orientações como o aleitamento materno e importância da alimentação infantil fazem a infância no país ser muito mais saudável em todos os aspectos.
Zilda morreu fazendo o que gostava, ajudar os que precisam e levar a coisa mais preciosa que podemos dar a alguém: a informação e os caminhos para evitar males maiores a saúde.
Obrigada Zilda, sua vida foi pautada em muito mais do que a caridade, você fez como médica o que poucos conseguiram fazer em tempos modernos, uma verdadeira Osvaldo Cruz de nossos tempos. A Enfermagem te agradece, nós que carregamos esta bandeira há anos de fazer prevenção num pais curativista sabemos o valor que o seu trabalho deixou. Você salvou milhares de vidas inocentes, descansa em paz.
Minha admiração a todos que fazem este trabalho maravilhoso e de muito amor e dedicação que é levar a informação no corpo a corpo com a população, sou do pré-hospitalar(SAMU), salvo vidas, vejo tragédias diariamente, entro embaixo de carros capotados, subo morros, desço barrancos, na chuva e no sol, mas rendo-me ao trabalho edificante destes profissionais comprometidos com o bem do próximo.
Isto sim, é Saúde Pública.
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